Através deste artigo, iremos rever um assunto que foi polêmica há poucos anos. O sibutramina (cloridrato de Sibutramina monoidratado) vem sendo utilizado para fins de tratamento da obesidade no Brasil há cerca de quinze anos e a pergunta que ainda se faz é se este medicamento é seguro para os pacientes.
Tal questionamento ocorre, em grande parte, devido ao amplo estudo SCOUT(1), que foi concluído em 2009 e publicado no conceituado New England Journal of Medicine em 2010, onde foi observado um aumento de cerca de 16% para o risco de infarto e outros efeitos cardiovasculares, inclusive o derrame cerebral.
Porém, deve-se salientar que o estudo foi realizado com indivíduos que apresentavam sobrepeso ou obesos, de 55 anos de idade ou mais, com doença cardiovascular preexistente e diabetes mellitus tipo 2. Além disso, a taxa de risco para mortalidade não acompanhou o aumento do risco para os efeitos cardiovasculares não fatais.
Em 2011, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), após a realização de um estudo sobre a venda de inibidores de apetite publicado no Boletim de Farmacoepidemiologia do SNGPC (Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados)(2), onde ficaram constatadas “distorções em relação ao uso continuado desses produtos e à combinação medicamentosa com ansiolíticos e antidepressivos…” resolveu cancelar o registro dos produtos mazindol, anfepramona e femproporex, além de impor um maior controle para a comercialização do sibutramina.
Esta determinação em relação a sibutramina não seguiu as medidas de suspenção da venda do medicamento na Europa, EUA e Austrália, o que fez a polêmica aumentar por aqui.
Alguns levantamentos atuais mostram que as medidas rigorosas adotadas pelo Ministério da Saúde para o uso do sibutramina fizeram com que houvesse uma redução importante na sua prescrição e dispensação de 2009 até hoje.
Uma amostra deste fato vem de Tamandaré/PR, onde Busato (2014) avaliou a dispensação de sibutramina em uma determinada farmácia. Segundo o autor “Os resultados mostraram que… em 2009 foram dispensados 224 receitas e em 2013, 12 receitas.”
Por que usar o sibutramina?
Parece lógico dizer que um medicamento deve ser eficaz para o tratamento a que se propõe. O sibutramina possui duas ações clinicamente importantes: saciogênico (produz sensação de saciedade) e termogênico (acelera o metabolismo basal).
Estas duas características, através de toda uma bioquímica agindo no sistema nervoso, promovem um comprovado emagrecimento. As pesquisas mostram isso.
Ferreira e Gomes (2009) analisaram 487 prontuários de pacientes que se submeteram ao tratamento para perda de peso durante quatro meses. Segundo os autores, “pode-se observar que o grupo sibutramina apresentou uma média de perda de peso de 4,9Kg, 6,6Kg e 9,6Kg em 2,3 e 4 meses, respectivamente…”
Outro estudo, conduzido por Menezes (2010) e objetivando avaliar a eficácia e a segurança de determinada dosagem para pacientes com IMC superior a 35, levou em consideração os parâmetros de peso, circunferência abdominal e perfil metabólico.
Todos os parâmetros avaliados sofreram redução considerável, incluindo no perfil metabólico a glicemia, o HDL colesterol e o colesterol total. Assim, o autor conclui que “sibutramina é uma indicação segura e eficaz em pacientes obesos com IMC superior a 35”.
Assim, ponto a favor do sibutramina, que apresenta eficácia na perda de peso, sendo este um bom motivo para utilizá-lo.
Seguindo a linha de pontos a favor do uso, Melo(3), tratando de remédios de forma geral, conceitua: “O medicamento é considerado eficaz e seguro, quando a relação risco/benefício está equilibrada , ou seja, os efeitos terapêuticos e os efeitos adversos ou tóxicos indesejáveis estão em equilíbrio.”
Mesmo indo contra os conceitos de países que já o baniram do mercado, este parece ser o entendimento do Ministério da Saúde em relação ao sibutramina, haja vista a sua liberação para uso e comercialização até o momento.
Diversas pesquisas têm apontado para o uso seguro do remédio, desde que seguidos os instrumentos regulatórios estabelecidos pela ANVISA. Sendo assim, além de eficaz, ser relativamente seguro ao uso pode ser considerado um segundo motivo para o uso do medicamento.
Por que não usar o sibutramina?
Precisamos lembrar os pontos contra o uso do sibutramina e, em contrapartida aos pontos positivos já apresentados, Pletsch (2011) lembra que “Seu uso exige um acompanhamento médico cuidadoso, já que este fármaco não atua apenas diminuindo o apetite, mas exerce ação estimulante no sistema nervoso central e no sistema cardiovascular, podendo provocar aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca, além de ação broncodilatadora, insônia, ansiedade, angústia e inquietude, o que faz com o risco/benefício nem sempre sejam favoráveis.”
Suyenaga (2012) relata que “Em geral, os principais efeitos indesejáveis relatados pelos pacientes, são: boca seca, constipação, insônia, discreta elevação da pressão sanguínea e aumento da frequência cardíaca.”
No Brasil, nos últimos anos, foram noticiados casos isolados de morte de jovens, pelo menos um em Goiás(4) e outro em São Paulo(5), que faziam uso do sibutramina. No entanto, até a época das notícias, não havia a confirmação de uma causa direta do medicamento em ambos os casos.
É importante considerar que, mesmo o produto estando totalmente liberado no mercado brasileiro, a ANVISA mantém as restrições (instrumentos regulatórios), exigindo que pacientes e médicos assinem um termo de comprometimento para seu uso.
Além disso, a dosagem também é limitada a 15mg do remédio por dia. Ora, também parece lógico que tais medidas seriam desnecessárias, caso o remédio fosse considerado totalmente seguro, não obstante as pesquisas.
Uma lógica para o tratamento da obesidade
Podemos dividir os tratamentos para a obesidade em três grandes grupos: os não medicamentosos, os medicamentosos e os cirúrgicos. Existe uma lógica a seguir: primeiro o não medicamentoso, depois o medicamentoso e, por último, o cirúrgico. Esta sequência deve ser encorajada ao paciente.
Caso uma real mudança nos hábitos alimentares, associada a um programa de exercícios físicos adequados ao paciente não sejam suficientes para reduzir o seu peso, o sibutramina, em ausência das contra-indicações e com controle médico, é uma opção de tratamento farmacológico. Ainda mais quando a obesidade está causando outras doenças (comorbidade), como hipertensão ou diabetes.
Para o Dr. Geraldo Santana(6), “Qualquer que seja o método utilizado, é preciso frisar que a participação do paciente é fundamental para o sucesso do tratamento. Todas as técnicas possuem seus pontos positivos mas também custos, possíveis efeitos colaterais ou potenciais complicações.
Portanto, antes de iniciar uma nova abordagem de tratamento, o paciente deve conversar com seu médico para compreender quais os benefícios esperados e possíveis dificuldades que poderá enfrentar.”
Portanto, mesmo que o tratamento com o sibutramina esteja aceito e instituído, sempre é desejável o melhor entendimento e avaliação, por parte do paciente, de seus pontos positivos e negativos. Afinal, devemos ser agentes de nossa própria saúde.
Este artigo foi escrito por Adriano Daudt (Editor do site Temas de Saúde)Bibliografia e fontes consultadas
– (1) Effect of Sibutramine on Cardiovascular Outcomes in Overweight and Obese Subjects. SCOUT Investigators. The New England Journal of Medicine (n engl j med 363;10 nejm.org september 2, 2010)
– (2) SNGPC – Boletim de Farmacoepidemiologia. Inibidores de apetite no Brasil: Reflexões sobre seu consumo nos anos de 2009 a 2011. Ano 2, nº 1 | jan./jun. de 2012
– (3) Melo, MGM. Vigilância Sanitária de Medicamentos. Secretaria Estadual de Saúde do Estado de Minas Gerais.
– (4) http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=SaladeImprensa&acao=crm_midia&id=182
– (5) http://g1.globo.com/goias/noticia/2012/12/jovem-morre-em-goias-apos-usar-remedio-para-emagrecer-diz-familia.html
– (6) http://www.endocrinologia.com.br/mt/tratamento-atual-da-obesidade.php
– Busato JG. Paula CS. Avaliação da dispensação de sibutramina no período de 2009 a 2013 para pacientes de uma farmácia do município de Almirante Tamandaré – PR. Visão Acadêmica, Curitiba/PR. Setembro, 2014
– Ferreira L. Gomes E. Estudo sobre a eficácia do uso de inibidores da recaptação de norepinefrina e serotonina no tratamento da obesidade (Sibutramina®). Revista Saúde e Pesquisa. Maringá/PR. 2009
– Menezes CA e colaboradores. Efeito da sibutramina na redução do peso e no perfil metabólico em indivíduos obesos de uma população brasileira. Revista de Ciências Farmacêuticas Básica e Aplicada. Ilhéus/BA. 2010
– Pletsch MU. e colaboradores. Dispensação de medicamentos contendo sibutramina antes e após RDC Nº 52/2011. Relatório técnico-científico apresentado na XIX Jornada de Pesquisa. Ijuí/RS. 2014
– Suyenaga ES. Massoni T. Sibutramina sob a óptica da química medicinal. Revista Eletrônica de Farmácia. Novo Hamburgo/RS. 2012
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